Hipnodontia: o uso da hipnose na odontologia

Sabias que a hipnose é utilizada na medicina dentária? O hipnoterapeuta Alberto Lopes explica-nos como funciona, neste Dia Mundial da Saúde Oral.

A hipnose na Odontologia é uma técnica que tem sido cada vez mais utilizada para melhorar a eficiência e conforto dos tratamentos odontológicos. Esta técnica consiste em conduzir o paciente a um estado especial de consciência (transe hipnótico), permitindo a utilização dos recursos do corpo e da mente para a realização do tratamento dentário. Quando em hipnose, para além de um interessante relaxamento físico e perspicácia mental, existem mudanças corticais e subcorticais realmente assinaláveis. Por exemplo, há uma maior irrigação sanguínea em determinadas áreas do cérebro com o incremento de substâncias opiáceas naturais (beta endorfinas), que inibem a dor e trazem uma sensação de calma e bem-estar. 

A hipnose pode ser aplicada diretamente no consultório, se o profissional dentista dominar os padrões de linguagem hipnótica, ou poderá ser também aplicada anteriormente, por um profissional hipnoterapeuta que irá deixar mecanismos de condicionamento (gatilhos hipnóticos), por forma que o paciente possa entrar em auto-hipnose na altura da intervenção. Dessa forma é o próprio paciente que aprende a entrar em estado biológico e natural de transe momentos antes da intervenção. De uma ou de outra forma a hipnose é realmente muito eficaz no controle e modulação da dor, na gestão da ansiedade, na maioria das vezes com o seu uso não requer medicamentos, tornando-a uma alternativa segura e eficaz para o tratamento odontológico.

A hipnose sendo uma técnica natural e absolutamente inócua apresenta inúmeros benefícios tanto para o paciente quanto para o dentista. Para o paciente, a hipnose pode ser usada para inibir a dor e desconforto durante o tratamento, controlando a salivação e o sangramento. Além disso, o paciente pode ter a sensação de que o tempo do tratamento passa mais rapidamente, devido ao seu estado de relaxamento. Já para o dentista, a hipnose facilita o atendimento, uma vez que o paciente hipnotizado estará mais calmo e permitirá que o dentista se concentre no procedimento clínico. Além disso, a hipnose pode ajudar a controlar a ansiedade e o medo do paciente, tornando o atendimento mais eficiente e produtivo. Ou seja, o uso da hipnose na Odontologia traz algo de novo à forma como podemos ajudar a libertar o medo, a ansiedade e a controlar a dor de quem recorre ao médico dentista. 

Todos conhecemos pessoas que só de pensar em ir ao dentista ficam ansiosas e precisam de ser sedadas. É natural que cada vez mais as pessoas procuram métodos naturais para a saúde mental e física e no controle da ansiedade e da dor, a hipnose pode fazer a diferença. Sendo um método eficaz e seguro melhora a qualidade dos tratamentos odontológicos, tornando-os mais confortáveis e eficientes para o paciente e para o dentista. Por esta razão, a hipnose está a ganhar cada vez mais espaço na área da Odontologia e, na minha opinião, é uma ferramenta que deve ser considerada por todos os profissionais da área. 

O objetivo principal da hipnose em odontologia é proporcionar um atendimento mais confortável, ao mesmo tempo evitando o uso excessivo de medicamentos e anestesias. No entanto, é importante ressaltar que a dor é uma experiência neurossensorial de carácter desagradável com duas variáveis a ter em conta: a sensorial – que dá uma informação sobre a localização da dor e o tipo da mesma (se é uma dor dilacerante, sensação de queimadura, sensação de frio ou de formigueiro); e outra afetiva – que nos fala da experiência subjetiva da dor, (o quanto a dor nos incomoda). É aqui que a hipnose tem tudo a ganhar e nada a perder, pois as vantagens para o paciente e profissional de saúde são imensas, por exemplo o uso da hipnose em odontologia permite: a inibição de dor – o estado de relaxamento que o transe produz acompanhado de algumas sugestões para o subconsciente do paciente inibem a dor e quaisquer desconfortos gerados durante o tratamento; o controle da salivação –  naturalmente estando o paciente calmo produz menos saliva, facilitando o atendimento odontológico; reduz o sangramento – sabemos que os tratamentos invasivos causam sangramento, aumentado pelo stresse e ansiedade. Ora o uso do transe acalma o paciente, controlando a intensidade do sangramento e salivação durante o procedimento; e finalmente, a percepção de tempo é reduzida, isto é, estando o paciente hipnotizado, este terá a sensação de redução do tempo do tratamento (distorção temporal).

É fundamental que as sessões sejam realizadas num ambiente seguro e adequado, para que haja uma maior concentração do paciente aos padrões de linguagem hipnótico e/ou aos comandos do dentista hipnólogo. A principal ferramenta a usar na indução  hipnótica é a fala e uma linguagem apropriada, um tom de voz calmo e monocórdico com sugestões diretas, indiretas e subliminares que passam diretamente para o inconsciente do sujeito a ser hipnotizado. O processo de indução pode ser feito com o paciente de olhos abertos, focado no que lhe é sugerido (por exemplo, um ponto na parede, focar os dedos do profissional), ou através do transe naturalista (transe conversacional). Em poucos minutos, o paciente entra num estado de relaxamento profundo, permitindo o atendimento odontológico. 

Existem diversos graus de hipnose, mas os estudos recentes indicam que em média 90% das pessoas são sugestionáveis à hipnose. Quer isto dizer que 9 em cada 10 pode recorrer à hipnose para um tratamento dentário ou outro. Importa dizer que o paciente pode atingir níveis de estado inconsciente que são do leve, moderado ao profundo, de acordo com o tempo necessário para a realização do procedimento odontológico. Normalmente, a indução em hipnose é realizada antes do paciente sentar-se na cadeira do dentista, para depois iniciar o procedimento em estado sonambúlico.   

Quando se trata do uso da hipnose em odontologia, é aplicado um protocolo hipnótico adequado ao tipo de intervenção, e quando o paciente entra em transe, sendo um estado especial de consciência em que a mente do sujeito está altamente sugestiva, o dentista pode sugerir sentimentos de bem-estar, usar técnicas de dissociação, tipo Lugar Seguro e outros procedimentos hipnóticos, o que permite que muitas intervenções sejam realizadas sem anestesia. Porém, é fundamental que o profissional tire todas as dúvidas do paciente e incentive o mesmo a aceitar o procedimento, sem imposição, mas passando confiança. Lembro que só entra em hipnose que se permitir a entrar em transe.

A hipnose não é uma panaceia e como todas as técnicas existem algumas limitações, mas as vantagens são incomparáveis. Neste caso, em odontologia, a hipnose é uma técnica eficaz e segura, que proporciona ao paciente uma experiência mais confortável durante o tratamento, controlando a ansiedade, aliviando a dor e gerindo o stresse do tratamento odontológico. Ela também pode ser utilizada para auxiliar na remoção hábitos nocivos, como: roer unhas, morder lápis e caneta, excesso de açúcar e melhorar hábitos de higiene. 

No entanto, é fundamental que ela seja aplicada por um profissional capacitado e que conheça todas as suas limitações. Além disso, é importante preservar a integridade física e emocional do paciente em transe. Tenho para mim que é uma das premissas mais importantes ao se aplicar a hipnose e criar a confiança necessária a um tratamento satisfatório e prazeroso. Além disso, é fundamental que o profissional saiba identificar até que ponto a sua técnica é suficiente para o caso, e caso perceba que o paciente precisa de outros tratamentos, encaminhá-lo a outros profissionais, como psicólogos e psiquiatras, é uma conduta ética recomendável.

Texto da autoria de: Dr. Alberto Lopes, neuropsicólogo/hipnoterapeuta e Diretor clínico da Clínica Dr. Alberto Lopes - Psicologia & Hipnose Clínica